segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Huambo – 100 Anos

Centenário comemorado com alegria e múltiplos eventos festivos

A cidade do Huambo assinalou em 21 de Setembro o primeiro centenário da sua fundação, em 1912, com um vasto programa de eventos festivos desde actividades políticas, culturais e desportivas, a iniciativas menos habituais como feiras de gastronomia e de agro-pecuária. O programa foi encerrado com a eleição da mulher mais bela da região, a Miss Huambo 2012.


No plano das tradições locais, foi realizada a festa dos “Bons Ventos”, um ritual tradicional para pedir chuvas e boas colheitas, numa altura particularmente delicada em que a seca ameaça comprometer estas actividades produtivas, do ponto de vista económico, que se traduz por carência no sector agrícola.

O lançamento de uma obra literária da autora Yelisa Visimilo, “Navegando no Tempo”, foi um dos momentos culturais integrados na comemoração do centenário.

A cidade do Huambo, pensada e construída de raiz numa região onde antes não existia sequer uma única povoação, foi fundada pelo então governador-geral de Angola, o general português José Norton de Matos, por despacho administrativo emitido pela portaria número 1040, datado de 8 de Agosto de 1912. A ideia não foi inocente: era preciso contrariar a previsível influência territorial inglesa na zona, que já era chamada de Pauling Town, designação da firma britânica que estava a construir o Caminho de Ferro de Benguela (CFB). Para ali já eram enviadas de Inglaterra algumas cartas postais.

Dei ordem aos correios da Província para devolverem à procedência tal espécie de correspondência, com a indicação de destino desconhecido, e pus-me a estudar a fundo o caso de Huambo”, conta o visionário general nas suas memórias publicadas em livro.

Com pulso de ferro, desafiando algum mal-estar britânico até a nível diplomático, o governador português aproveitou a inauguração da estação ferroviária local para fundar a cidade com uma simples casa pré-fabricada de madeira e marcar bem o domínio português naquela região.

Norton de Matos, face às enormes potencialidades do planalto central, viu ali oportunidade para uma colonização intensiva na agricultura e pecuária, que serviriam em seguida para base e incremento de outras actividades produtivas.

Cem anos e uma guerra civil depois, o Huambo é hoje uma cidade belíssima, em desenvolvimento e que promete surpreender em desempenho regionale nacional, agora que o advento da paz precisa de ser traduzido em desenvolvimento geral do país e melhoria das condições económicas e sociais das populações.

A localização da cidade resultou da convergência potencialmente conflituosa dos planos de colonização portuguesa para o planalto com o traçado da linha do Caminho de Ferro de Benguela, via férrea que atravessa Angola do Lobito até ao Zaire (actual República Democrática do Congo). Norton de Matos, que formalizou a fundação do Huambo a 21 de Setembro de 1912, ao quilómetro 426 do CFB, numa casa pré-fabricada de madeira, quis contrabalançar a influência da companhia concessionária dos caminhos-de-ferro, que destinavam a região a um grande centro de colonização europeia sob sua influência, face à necessidade de contratação e estabelecimento de pessoal técnico de vários países europeus para a construção, manutenção e exploração económica das linhas.

Ele opôs-se de maneira nacionalista à ocupação internacionalizante, defende o arquitecto português José Manuel Fernandes, autor de “Angola no século XX : cidades, território e arquitecturas”.

Em 1928, o alto-comissário António Vicente Ferreira mudou o nome da cidade para Nova Lisboa e tornou-a capital de Angola, com a proposta inclusa de mais tarde passar a ser capital de Portugal, alterações com as quais Norton de Matos nunca concordou. Mas embora o nome tenha vigorado até à independência nacional, a passagem a capital não saiu do papel, tendo o Huambo sido sempre, no máximo, a segunda cidade de Angola. Segundo a historiadora angolana Maria da Conceição Neto, até 1950 o desenvolvimento económico, demográfico e urbano propriamente dito do Huambo era incipiente, se comparado com Luanda. Em 1950, quando Luanda tinha mais de 140 mil habitantes, o total no Huambo/Nova Lisboa não chegava a 30 mil e a indústria só se desenvolveu, de facto, após 1961. Em 1974, a cidade teria uns 65 mil habitantes, Luanda quase meio milhão. Com a guerra civil, a destruição das principais vias de comunicação isolou e asfixiou a cidade e a insegurança provocou vagas de deslocados que a despovoaram. No entanto, apesar de muito danificada pela guerra, a cidade esteve basicamenteparada e não foi violada, ao contrário de Luanda, que foi muito desconfigurada.

No final da década de 2000, o então governador da província Paulo Kassoma foi responsável por uma “operação de cosmética” que permitiu “limpar a imagem terrível e dolorosa dos edifícios cravados de balas” e devolver “o ar limpo e de paz à cidade”, segundo uma investigadora atenta ao percurso da cidade capital do planalto.

Subsistem, apesar da revitalização, problemas decorrentes de uma muito maior concentração urbana e nos seus perímetros, nomeadamente ao nível do saneamento básico, água potável ou electricidade, mas a sua reciclagem nos últimos anos mostra que o Huambo tem uma enorme capacidade de regeneração e vai com certeza surpreender.

Agora, os comboios do CFB já chegam de novo ao Huambo e prosseguem para o Moxico,  não tardará muito para um fim de viagem na fronteira com o Zaire, de onde regressarão ao porto comercial do Lobito com minérios a exportar para vários países do mundo. E o Huambo, que esteve em vias de ser assimiladopolítica e administrativamente pelos ingleses, só tem motivos para regozijo.
in Jornal Chela Press de 10.10.2012

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