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terça-feira, 1 de outubro de 2013
Ombala Grande poço de história e cultura
Conhecer uma Ombala, símbolos do poder tradicional dos antigos reinados das regiões Centro e Sul do país, não é tarefa fácil, mesmo que para tal reunamos condições, devido à sua localização, estruturação, exigências, indisponibilidades dos guias e contactos, que muitas vezes terminam num fracasso .
Depois de nos termos reportado, há pouco menos de um mês, às Pedras do Kandumbu, antigo forte de resistência dos Wanbus, vamos desta vez retratar, a Ombala Grande do Huambo, em Samisasa, onde repousam os restos mortais do Rei Livongue e sua esposa, falecidos em 1902, em combate, aquando da penetração e ocupação portuguesas .
O monumento à escala de 1: 4000 está localizado a 18 quilómetros da capital do Planalto Central. Nesta empreitada, conduziu-nos Festo Sa palo, historiador do Museu Regional do Planalto, colocando-nos à dispo sição todos os elementos necessários para o trabalho que pretendíamos fazer .
Não obstante os acessos difíceis (picadas, matagais e ravinas), a Om bala mantém a tradição que sempre a caracterizou continua a ser procurada para petições, veneração e outros rituais ancestrais .
A visita a este local, tido pelas entidades tradicionais como lugar sagrado, deve ser comunicada 24 horas antes, à Direcção Provincial da Cultura, para que seja indicado um guia, que, além de orientar os turis tas responsabiliza-se pelos contactos junto da Corte .
Cumprida a formalidade, os visitantes são orientados a preparar oferendas para o ritual: animais para sacrifício, sal, óleo de palma, bebidas espirituosas, cigarros e fósforos. Curiosamente, a nossa visita coincidiu com realização de um destes rituais. Fomos convidados e assim acedemos.
Prosseguindo, a escassos metros do local, fomos orientados a depositar um valor simbólico no interior do chapéu de um ancião, como se de licença se estivesse a pedir para entrar .
Posteriormente fomos ungidos com óleo nas costas das mãos com uma erva escorregadia chama da límbui. Cumprida esta etapa, fomos conduzidos até ao Memorial, aguardando no exterior por outros
procedimentos. Rigorosamente e à semelhança das outras ombalas da região, o acesso ao chamado lugar sagrado, akokoto ou crânios, dos soberanos que ali governaram, depende da comunidade .
Porém, só acontece quando estes são assolados por calamidades como a estiagem, doenças estranhas, inundações, infertilidade das mulheres ou guerras sucessivas .
Além dos produtos já referencia dos, é acrescentada uma cabeça de gado, um a dois barris de vinho, cinco cabritos, vinte ou mais galinhas e aviso prévio as comunidades .
Em seguida, é sacrificado um bode e a seguir uma galinha, e o sangue é espalhado no recinto .
A este junta-se o vinho e a aguardente que são espalhados a no mesmo recinto .
Dando sequência, os anciãos que fazem parte da Associação Secreta da Ombala, preparam o acto ou a ceri mónia religiosa, associada às várias canções tradicionais, com danças, declamação de poemas, narrações históricas, entre outras manifestações .
Um ancião dirige-se para o interior do santuário, pedindo licença com palmas que são completadas por algumas palavras e em seguida, retiram-se os crânios embrulhados num lençol branco e partir daí ao crânios são venerados e ungidos com o mesmo óleo.
Trata-se de um ritual que segundo o guia, no caso concreto das comunidades, pode durar alguns dias, de acordo as circunstâncias para “convencerem” o soberano. Esta realidade, demonstra claramente que o bantu pensa e acredita nas suas divindades e sente a sua proximidade .
Festo Sapalo conta igualmente que, Nganda la Kawe, Esake e Samisasa são as três verdadeiras comunidades fundadoras deste grupo. Só estas reúnem condições inatas que confirmam a sua pre-destinação para patriarcas, sacerdotes, juízes, protectores e condutores da comunidade .
São linhagens da consanguinidade genuína, ligados a dois expoentes básicos: terra e sangue. Na primeira estão conservadas os crâneos do rei, tidos como fonte de vida, sabedoria e exemplo de virtudes; sacraliza das por esta presença, entrega com generalidade os alimentos .
A segunda relacionada ao sangue, representa algo mais profundo e transcendente, por ser a expressão e vínculo da vida, princípio emanente, a própria razão de ser do grupo, que se desenvolve e pontifica através das apertadas regras da consanguinidade e parentesco .
Consta que a conservação desta linha sucessora e sacralizada, asse gura a preciosamente a continuidade indiscutível de atitudes, crenças, gestos e comportamentos .
Festo Sapalo, realça que, o rei é considerado o sangue e espírito dos antepassados, e comunicante do dinamismo vital, pessoa sagrada, responsável pela comunidade. Este é o pensamento profundo do povo, disse o historiador Festo Sapalo .
O destaque de visitas recai sobretudo, aos turistas estrangeiros, estudantes do I e II ciclos, ensino superior e entidades do governo .
Segundo o historiador, o rei desem penha uma função fundamental no seio do grupo. É a pessoa mais qualificada e vitalmente mais poderosa, guia da comunidade e guardião das suas tradições .
Estudantes em defesa da Ombala Devido a sua importância histórico cultural, os estudantes apelam às entidades superiores a considerarem o restauro de modo a preservá-lo para a posteridade .
Apesar de arruinado tem servido de estudo por parte de estudantes de história e não só para suas teses de doutoramento. João Fernandes é um dos jovens estudantes do Instituto Politécnico do Huambo, que tem participado nestas expedições em grupos de estudo e caravanas de vistas. Impressionado com a história do Memorial, disse ter estado a aprender bastante com as entidades pela tradição oral, o que segundo ele, contribuirá para a sua licenciatura em história .
O grito parece ter sido ouvido e segundo consta a sua reabilitação contará do plano das demais Om balas. Há uma semana realizou-se junto do túmulo do Rei Livongue ali sepultado, a tradicional festa dos “Akokotos”, caracterizada pela veneração aos túmulos dos sobera nos reis e sobas da Corte do Reino do Huambo .
A cerimónia realizou-se na om bala Kalikoke, arredores da cidade do Huambo e enquadrou-se na ce lebração do 101 anos de existência da Cidade Vida.
A Ombala é circundada por vegetação e rochas. Até 1902, era constituída pelo chamado rochedo do país, a casa do rei, cozinha da rainha, rocha do conselho, casas das esposas do rei, as chamadas mura lhas de pedra (olongagawe) e casas e grutas dos espíritos .
Juntava-se a estes, Mukutu (mestre-de-cerimónias fúnebres), casa dos guardas do palácio (kuenje welombe), pórtico do rei e do povo (kasengo) e um rio subterrâneo. À semelhança de outras do género, no passado eram consideradas enigmas envoltas em mistérios.
Hoje, tornou se uma importante fonte do saber, recebendo semanalmente visitas não só de estudantes na prepara ção de teses, assim como de outras entidades interessadas pela história e cultura da região .
Actualmente, é protegida pelo rei da Corte e tem 25 sobas, sendo o principal Filipe José Moco. É habita da ao redor pelas comunidades Petróleo, Kalikoke, Kisala e Kassongo .
in O País de 01.10.2013
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